A cultura do cancelamento e a possibilidade de aprendizagem
- rodapeworkfemale
- 16 de set. de 2020
- 2 min de leitura
Numa dessas tardes de quarentena, eu estava escutando um podcast do “É nóia minha?”, intitulado “Não é só você que está em crise” e um dos assuntos abordados foi o cancelamento na Internet. Esta é uma pauta que está repercutindo muito, tanto pela alta quantidade de casos, quanto pelos questionamentos sobre os prós e contras de se “cancelar” alguém. Interessante lembrar que questões relacionadas a vigilância social sempre existiram, mas se potencializaram com o advento da Internet, gerando ondas de ataques virtuais.
O termo “cancelar” surgiu como um ato em resposta ao uso inadequado do poder de influência possibilitado pelas redes. Normalmente, são acometidos a pessoas públicas, conhecidas pelo alcance e números de seguidores, que erram no falar e perpetuam discursos de ódio que não cabem mais na sociedade em que vivemos. O objetivo é repreender e abrir espaço para discussões e consequentemente, aprendizados sobre o tema. Pensando sobre quem é alvo do cancelamento, algo a ser pontuado é a responsabilidade da fama. Se colocar como pessoa pública, exige a consciência do poder de fala, no sentido de que a opinião compartilhada influencia o público.
A realidade dessa cultura, no entanto, é de um ataque irresponsável, com pessoas prontas a ofender o primeiro que “escorregar”. Isto não significa que devemos ser tolerantes com comportamentos inaceitáveis, que ferem minorias sociais. Porém, é preciso abrir espaço de diálogo e entender os motivos de tal pensamento ainda se perpetuar e para além disso, dar chance retratação e mudança. O resultado deste cenário caótico é, por exemplo, o medo do cancelamento, em que pessoas simulam opiniões corretas para continuarem aceitas na sociedade, mas sem a consciência, de fato.
“A grande crítica a respeito desse movimento é que, apesar da ideia ser nobre, a execução pode apresentar problemas. O cancelamento age como uma punição, mais do que como apontar uma conduta errada e permitir que aquele que cometeu o erro se redima. Ao mesmo tempo aquele que pede o cancelamento pode estar fazendo um julgamento precipitado de situações que por vezes são mais complexas do que aparecem na mídia", diz o psiquiatra, Galicano Brazuna, ao G1.
Acredito que essa cultura do cancelamento foi conduzida por algo fundamental nesta geração, que é a desconstrução, totalmente necessária para nossa evolução como humanidade. Contudo, parece haver um senso de perfeição um tanto exagerado e uma disputa sobre quem é mais “desconstruído”, que ignoram os processos individuais de crescimento, conduzidos em tempo diferentes. Junto a isso, existe também a perspectiva de cancelar um pensamento por ser contrário ao que se pensa e não por apresentar alguma agressividade.
Não há como negar a necessidade urgente de encerrarmos com tais discursos, mas existem maneiras mais eficazes de fazê-lo, sem passar o famoso “pano” ou negar o diálogo. Cabe a nós buscarmos tais caminhos!
Por Maria Luiza Soares
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